A Fonte Grega, de Simone Weil

«Que homens tenham por futuro a morte, é algo contra natura. Logo que a prática da guerra tornou sensível a possibilidade de morte que cada minuto encerra, o pensamento torna-se incapaz de passar de um dia ao dia seguinte sem atravessar a imagem da morte. O espírito sofre então uma tensão que só suporta por pouco tempo; mas cada nova aurora traz a mesma necessidade; os dias acrescentados aos dias fazem anos. A alma é violentada todos os dias. Todas as manhãs a alma mutila-se de toda a aspiração, porque o pensamento não pode viajar no tempo sem passar pela morte. Assim, a guerra apaga qualquer ideia de objectivo, mesmo a ideia dos objectivos da guerra. Apaga o próprio pensamento de pôr termo à guerra. A possibilidade de uma situação assim tão violenta é inconcebível enquanto não a vivemos; o fim é inconcebível quando nela nos encontramos. Por isso nada se faz que conduza a esse fim. Os braços não podem deixar de segurar e de manipular armas na presença de um inimigo armado; o espírito deveria congeminar para encontrar uma saída; perdeu qualquer capacidade de congeminar o quer que seja nesse sentido. Está inteiramente ocupado em violentar-se. Sempre, entre os homens, quer se trate de servidão ou de guerra, as desgraças intoleráveis duram pelo seu próprio peso e parecem, assim vistas de fora, fáceis de carregar; duram porque retiram os recursos necessários para delas sair.»

A Fonte Grega, de Simone Weil
(tradução de Filipe Jarro)

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