Livrinho de Teatro nº 65 - peças de Nathalie Sarraute
De Nathalie Sarraute
Tradução de Diogo Dória, Jorge Silva Melo e Pedro
Tamen
Edição apoiada pelo Programa
de Ajuda à Publicação do Institut Français/ Ministério Francês dos Negócios
Estrangeiros e Europeus
Uma edição Artistas Unidos/ Livros
Cotovia
PVP 7 Euros
Nos Livrinhos de Teatro dos Artistas Unidos foram já publicadas peças de Spiro Scimone, Antonio Onetti, Juan Mayorga, Irmãos Presniakov, Jon Fosse, Joe Orton, José Maria Vieira Mendes, Jean-Luc Lagarce, Letizia Russo, Antonio Tarantino, Nuno Júdice, Miguel Castro Caldas, Pasolini, Dimítris Dimitriádis, Benet i Jornet, Werner Schwab, Peter Asmussen, Anthony Neilson, Lula Anagnostaki, Tim Crouch, Dea Loher, Gregory Burke, Pirandello, Enda Walsh, Jenny Schwartz, David Greig, Copi, Genet, K. Valentin, Angélica Liddell, Lluïsa Cunillé, David Lescot, Pau Miró, René Pollesch, Eduardo de Filippo, Pirandello, Valle-Inclán, Karl Valentin, JM Synge.
O Silêncio
Seis personagens não podem desenvolver um
diálogo nornal por causa do silêncio de uma sétima.
Mulher 2 Porque
ainda agora…
Homem 1 Ainda
agora o quê?
Mulher 2 Bom, tu
próprio...
Homem 1 Eu
próprio o quê?
Mulher 3 O
silêncio dele…
Homem 1 Mas
qual silêncio?
O Silêncio, Nathalie Sarraute
É Bonito
Um pai e uma mãe dividem-se sobre o olho irónico do seu
filho. A culpa parental assume neste texto proporções enormes. Mas a farsa da linguagem
esconde o drama da incomunicabilidade, do diálogo como luta, da linguagem como
traição.
Ela O que não impede que às tantas tenhas hesitado. Também
tiveste medo, confessa lá…
Ele Medo?
Eu? Estás a sonhar…
Ela Só te fica bem… Quem não tem medo… Mas tu, eu vi… há bocado,
quando ele te desafiou… quando te exaltaste… esmifraste-te…
Ele Ah,
isso não. Nem um bocadinho. Eu disse-lhe, gritei-lhe: É bonito. Bonito. Bonito.
Bonito…
É Bonito, Nathalie
Sarraute
Aqui está Ela
História
de uma obsessão. A obsessão é, bem como a linguagem, um dos temas recorrentes
de Sarraute.
Homem 2 Olhe, tenho que lhe dizer…
Preciso de falar consigo…
Mulher Sim? Sobre o quê?
Homem 2 É uma parvoíce… é muito
difícil… Não sei como… Por onde começar.
Mulher Diga lá, diga lá. Que fiz eu
desta vez?
H.2 Oh, nada. Nada. Nada, precisamente, não
fez nada. Não disse nada. Ficou calada…
Mulher Devia ter falado?
H.2 Sim, mais valia…
Aqui Está Ela,
Nathalie Sarraute
Por Tudo e Por Nada
Dois
homens confrontam-se, dois amigos discutem talvez por tudo e por nada. A tensão que existe nas palavras mais simples,
os movimentos físicos e psicológicos dão ao leitor uma sensação de mal-estar,
mas fascinam ao mesmo tempo.
Homem 2 “E
que tomem cuidado... que prestem muita atenção... são bem conhecidas as penas
em que incorrem aqueles que têm o desleixo de se permitirem assim, sem razão...
Ficarão marcados... Só com prudência é que nos aproximaremos deles, com a maior
das desconfianças... Toda a gente saberá de que é que eles são capazes, de que
é que podem ser culpados: podem cortar relações por tudo e por nada.”
Homem 1 Por tudo... e por nada? (Silêncio.)
Homem 2 Tudo
e nada?
Homem 1 Realmente não são a mesma coisa...
Homem 2 Realmente:
tudo. Ou nada.
Homem 1 Tudo.
Homem 2 Nada!
Por Tudo e Por Nada, Nathalie Sarraute
NATHALIE SARRAUTE, de seu nome verdadeiro
Natalyia Tcherniak, nasceu em Ivanovo (perto de Moscovo), na Rússia, a 18 de
Julho de 1900, numa família letrada da burguesia judia. Após o divórcio dos
pais, a mãe leva-a para Paris, onde frequenta a primária. Irá partilhar a
infância entre Paris e São Petersburgo. Tem uma educação cosmopolita, estuda
inglês e história em Oxford, sociologia em Berlim e finalmente direito em
Paris. Em1925,
casa com Raymond Sarraute, colega de faculdade. Exerce a profissão de advogada
até ser afastada dos tribunais em 1941, pelas leis nazis. Em 1932, escreveu o
seu primeiro livro, a recolha de curtas narrativas que intitulou Tropismes,
obra que veio a ser muito elogiada por Max Jacob e Jean-Paul Sartre, aquando da
sua publicação, em 1939. Será Sartre quem, em 1947, irá prefaciar o seu Portrait
d'un inconnu, lançando com ele a tese do “anti-romance”. Mas é com a
publicação de Martereau em 1953
que começa o seu reconhecimento, associado à prestigiosa Gallimard
que será sempre a sua editora. Em 1956, publica o ensaio A Era da
Suspeita, texto fundamental na renovação que veio a ser operada no
romance. E continua a publicar obras como Planétarium (1959), Entre
la vie et la mort (1968), Vous les entendez (1972), Disent les imbéciles
(1976), L'Usage de la parole (1980), Enfance (1983), Tu ne t'aimes pas (1989),
Ici (1995), Ouvrez (1997). Em 1963, foi-lhe atribuído o Prix international
de littérature pelo romance Les Fruits d´Or. E é neste ano, por
insistência de uma rádio alemã, a Süddeutscher Rundfunk, que, Sarraute inicia a
sua obra teatral com Le Silence. A que se segue Le Mensonge (1966), As
duas peças inauguram, em 1967, o Petit Odéon, com direcção de Jean-Louis
Barrault. Seguem-se Isma em 1970, C'est beau em 1975, Elle est là em 1980 ,
e finalmente Pour un oui ou pour un non, em 1986. Morreu aos 99
anos quando escrevia um novo texto para teatro. Sobre o seu teatro, disse
Nathalie Sarrraute: "As personagens começaram a dizer coisas que
normalmente não são ditas. O diálogo deixou a superfície, desceu e instalou-se
no patamar dos movimentos interiores que são a substância dos meus romances,
instalou-se no pré-diálogo. Mas é preciso que a sensação, o que se sente, sejam
imediatos, trazidos por palavras comuns. Creio que para os espectadores a quem
me dirijo, este contraste entre o fundo insólito e a forma costumeira dá a
estes movimentos, tantas vezes escondidos, um carácter mais dramático, mais
violento. E também um efeito cómico, de humor. (...) Nas minhas peças, não há
acção, ela foi substituída pelo fluxo e refluxo das palavras”
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