Cocktail Party, T. S. Eliot

«EDUARDO: E onde irá dar isso tudo?
CONVIDADO DESCONHECIDO: Vai dar à descoberta
Do que realmente o senhor é. Do que realmente sente.
Do que realmente é, entre as outras pessoas.
A maior parte das vezes, damo-nos por certos e seguros,
Tem que ser assim, a lá vamos vivendo, pouco cientes
De nós próprios, do que fomos. Quem é o senhor agora?
Sabe-o tanto como eu, ignora-o talvez mais
Ainda. Não passa de um conjunto de obsoletas
Reacções. A única coisa a fazer
É nada fazer. Esperar.
EDUARDO: Esperar!
Mas esperar é o impossível.
Sobretudo, não percebe como isso me tornaria ridículo?
CONVIDADO DESCONHECIDO: Não lhe faz mal nenhum achar-se ridículo.
Resigne-se à condição de ser o bobo que é.
É o melhor conselho que lhe posso dar.
EDUARDO: Mas como posso esperar, não sabendo por que espero?
Deverei dizer aos meus amigos: "A minha mulher está fora."
E ouvi-los perguntar: "Para onde foi?" e eu dizer-lhes: "Não sei."
E dirão eles: "Mas quando é que ela volta?»
E eu responder: "Não sei se volta."
E eles: «Mas então o que é que você vai fazer?"
Respondo-lhes eu: "Nada." Hão-de julgar-me louco,
Ou pura e simplesmente vil.
CONVIDADO DESCONHECIDO: O que é excelente.
Acabará por descobrir que sobrevive à humilhação.
O que é uma experiência de valor incalculável.
EDUARDO: Escute: concordo que muito do que o senhor disse
É bem verdade. Mas ainda há mais.
A partir da hora em que a vi esta manhã, ao pequeno-almoço,
Não consigo lembrar-me como é a minha mulher.
Não tenho a certeza de ser capaz de a descrever,
Se tivesse de recorrer à polícia para a procurar.
Tenho a certeza de que não sei o que vestia
Quando a vi pela última vez. E mesmo assim quero
que volte.
Tenho que a fazer voltar, para descobrir o que aconteceu
Durante os cinco anos que fomos casados.
Tenho de descobrir quem ela é; descobrir quem eu sou.
E sendo assim, para que serve toda a sua análise,
Se acabo por continuar perdido em trevas?
CONVIDADO DESCONHECIDO: Claro que de nada serve viver mergulhado em trevas
A não ser o tempo suficiente para expulsar do pensamento
A ilusão de ter sempre estado em plena luz.
O facto de não poder dar qualquer razão para
Querer ter a sua mulher
É a melhor razão para crer que precisa dela.»

Cocktail Party, T.S. Eliot
*Tradução de José Blanc de Portugal

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